quarta-feira, 13 de junho de 2018

A visão do transtornado

Fiquei surpresa e feliz ao retornar aqui e ver que há um post desse ano, dois aliás. Esse blog já tá mais do que pra lá de episódico rs...

A razão que me traz aqui hoje é dolorida, amargurada... Mas espero que possa ajudar alguém que esteja na mesma condição que eu ou tendo que lidar com alguém que esteja. Diferente das outras postagens, é mais um desabafo que uma reflexão, mas... que no fim de tudo resulte em reflexão.

Quem me acompanha aqui sabe que tenho o diagnóstico de transtorno bipolar tipo I dado em 2012. Desde então faço tratamento com medicação e terapia e, na maior parte do ano, tento fazer atividade física regularmente (sério, ajuda muito!). As implicações disso na nossa vida atingem todas as esferas: família, trabalho, amigos, lazer... Tudo. E como lidar com isso?

Volta e meia dou uma fuçada na internet a procura de artigos e postagens mais confiáveis sobre relacionamentos e bipolaridade. Tudo o que encontro são coisas como "como agir com um bipolar" ou "meu marido é bipolar" ou "faça isso não faça aquilo com um bipolar"... Mas... Não vejo um bipolar dizendo como ele se sente em relação aos outros e ao mundo. Pois bem... Daí, ontem, querendo ver um filme que me fizesse refletir, assisti "Com amor, Vincent". Sobre a vida, sobretudo, a morte de Van Gogh. Ui... (longa pausa). E quase me fogem as palavras. Tido como "freak", doido, por vezes, gênio, Van Gogh foi um cara extremamente solitário que parecia se abrir somente para uns poucos seres no mundo, dentre eles, seu irmão Theo. E me identifiquei: com a tempestuosidade, com a dor, com o sofrimento.

Quem tem o transtorno precisa entender que, às vezes, nossa visão da realidade é comprometida. Nós a distorcemos para um contexto que nos é, não raro, anterior à situação vivida e por mais que nossos companheiros, familiares e amigos queiram nos fazer enxergar, não é na hora da crise que vocês vão conseguir. Se você tem um amigo, cônjuge bipolar (e principalmente do tipo I) precisa ser firme quando esta pessoa estiver em um de seus delírios, mas nunca, nunca seja hostil, nunca aja sem amor. Você já imaginou o que pode se passar pela cabeça dessa pessoa? Ou como ela se sente? Tratar seu marido como monstro ou sua esposa como um lixo NÃO vai melhorar a condição deles. Ao contrário, só vai piorar. Procure, com paciência, entender os motivos pelos quais seu companheiro ou amigo bipolar disse o que disse ou agiu como agiu. Sabendo as razões, você vai ter uma melhor compreensão daquilo que pode provocar uma crise (seja mania ou depressão). Em muitas situações, você vai precisar mesmo ser firme e conter seu amigo ou companheiro, mas entenda qual é seu inimigo. NÃO é contra o seu amigo que você deve estar.

É possível que um bipolar tenha um bom autoconhecimento e consiga perceber quando se excede. Em muitas situações, ele/ela pode conter seus impulsos e gerenciar suas emoções de forma a reagir com sabedoria. Mas, verdade seja dita, a não ser que seja um mestre zen, isso não ocorre 100% das vezes.

Se você escolheu se relacionar com um bipolar, precisa entender as consequências que o transtorno traz ao relacionamento. Ser rude, impassível e não procurar entender as causas das ações do seu amigo/companheiro só vai fazer a condição dele/dela piorar. Você precisa saber que, acima de tudo, é um relacionamento que requer muita paciência. Pense que será mais difícil do que lidar com alguém que não sofre de nenhum transtorno e por isso mesmo, vai exigir mais de você. Pense também o quanto será recompensador ver seu companheiro/amigo estabilizado, conseguindo administrar suas emoções e que, como todo mundo, tem muito a contribuir com a vida.